prolixo



... ou pouco mais de um quilo de cinza!


A minha vida assemelha-se a um furo num daqueles cartões que sorteiam qualquer coisa, mas no meu caso, um furo sem prémio. Mas isto não é uma reclamação, é meramente uma observação, uma consequência de acordar dez minutos antes de acordar. Este desfasamento matinal, permitiu-me ver a coisa de uma perspectiva diferente. Aqui vai o pensamento fantástico: não adianta pressagiar, o que conta é o dia de hoje e o dia de hoje é um furo sem prémio. 

Tenho pensado seriamente nisto, é raro pensar seriamente em alguma coisa, e cheguei à conclusão que morrendo hoje, nada do que fiz seria digno de registo, apenas um vulgar consumo de oxigénio, banda-desenhada e muita cerveja.

Posso comprovar o que digo usando a teoria dos 50 anos. Não fui eu que a inventei, deus me livre de ter ideias tão boas, não sei se li ou se foi de algum filme, nem tenho bem a certeza se eram 50 anos, mas 50 está na moda e para o caso pouca diferença faz, 50 ou 60, ou até mesmo 100, o que ela explica é que se eu morresse hoje, exactamente hoje, daqui a 50 ou 60 anos, vá, ninguém se lembraria de mim, e como a memória seria a minha única presença, eu deixaria de existir. Recapitulando, se eu morresse hoje (estou a usar o passado porque afinal não morri) a probabilidade de em 2075 todas as pessoas que me conheceram estarem mortas, ou com Alzheimer é bastante grande, logo em 2075 tudo o que sou simplesmente teria escoado em espiral por um gigantesco ralo, deixando ao mundo apenas um quilo e duzentos gramas de cinzas.

É claro que isto não se aplica a quem tem descendência, e por isso se dá algum valor aquela velha máxima de José Martí, "Hay tres cosas que cada persona debería hacer durante su vida: plantar un árbol, tener un hijo y escribir un libro."

Mas isto não é assim tão trágico quanto possa parecer, nem tão importante que me tire o sono. Acordar dez minutos antes de acordar é aborrecido, mas é tudo uma questão de adiantar o despertador dez minutos. E se pensar bem até já devo ter plantado alguma coisa, não sei se lá continua de pé ou se uma via rápida lhe passou por cima. Quanto aos "hijos" e "libros", a worldometers calcula que este ano já se publicaram 547.205 livros em todo o mundo, mais de 30.300.200 pessoas nasceram, 210.000 só hoje. Talvez o mundo esteja a abarrotar de "hijos" e "libros" e até agradece que fique quieto, sóbrio (545.084 morreram este ano devido ao consumo de álcool, quase tantos quanto livros publicados), mas quieto no meu canto. Consigo viver com isso.



pro·li·xo |cs| 

(latim prolixus, -a, -um, alongado)


adjectivo

Que usa demasiadas palavras
"prolixo", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa 

Comentários

  1. Eu sou do bando dos maus, quero ir próinferno, eu sei, achaste que eu ia dizer prolixo, mas não, é mesmo próinferno, que lá é que estão as brasas. Quanto ao texto, desejável é que se lembrem de nós enquanto vivos, depois... quero lá eu bem saber disso.

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    1. prolixo lê-se o x com som de fixo, não como em lixo :D

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    2. Ó afilhado, posso não ser muita letrada, mas também não sou burra ahahahahaahh

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