inane



De tão enfadado, nomeei a primavera como a pior das estações do ano. Já não quero as andorinhas a rasgarem os céus, nem ouvir o cuco nas imediações de pauis, basta do colorido das penas dos abelharucos equilibrados nos cabos telefónicos, tapo os ouvidos ao zumbido eléctrico de milhares de insectos, chega de pétalas e sépalas abertas, estigmas repletos de pólen e apocárpicos pendentes ao rubro. 

Tão enfadado ando que me aborreço, na ausência que antecede a partida, as letras não se condensam, as palavras suspendem-se como frutos verdes e largo a caneta, descaído o corpo na cadeira, fecho os olhos com círculos luminosos gravados na retina… invejo os jovens sentados nos degraus do coreto, bebendo sem pressa da boca um do outro em doses pequenas, levitantes como sacos plásticos cheios de esperanças largados à vontade do vento. 

Venha o outro vento, o que trás a chuva e os dias cinzentos.

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