Lãzudinho

 

Nasci numa família aristocrata anarquista, por isso em lugar das salvas de prata e dos potes vista alegre, tínhamos estantes cheias de livros. Cresci rodeado desses estranhos objetos e continuo a viver rodeado deles. Neste momento não ocupam uma estante, mas todos os espaços livres que possuo, em fila dupla, até ao tecto. Fico a pensar quem terá tido a brilhante ideia de fazer os livros assim, nesta forma tão prática e portátil. Colocar-lhe uma capa que os mantenha protegidos e ao mesmo tempo dar-lhes o peso necessário para que fiquem abertos, mesmo quando adormeço por cima deles, foi realmente de génio. Imagino-me a tentar ler um pergaminho no transporte, ou a empilhá-los por cima dos móveis e eles rolarem na mesinha de cabeceira.

Vem-me à memória um dos meus primeiros livros, se não me engano ainda existe e estará preservado nos arrumos dos meus pais. Chamava-se “O Burrinho e o Mar”, das edições Majora. Era uma coleção de pequenos livros, com umas 10 páginas, pouco texto e ilustrações cativantes, mas o do burro era o meu favorito e estava tão gasto que a primeira e a última página foram costuradas com linha verde. A história do Lãzudinho era um pouco estranha, porque o burrito queria muito ir trabalhar, apesar de ser demasiado jovem, mas graças à sua coragem e força de vontade, emigrou e arranjou emprego na praia a carregar crianças. Nem sei como é que os meus progenitores hippies deixaram este tipo de literatura chegar às minhas mãos, mas acho que na altura o que me cativava era o burro e talvez também um pouco o mar. Terei tido muitos mais livros, só que a família era grande e os livros passavam como a roupa, para a geração seguinte. O do burro só se salvou porque já tinha costuras, e por sinal, feitas por mim. 



Comentários

  1. Não nasci no seio de uma família aristocrática, nem sequer burguesa e muito menos os meus progenitores eram hippies. Mas lá que gostaria de ter tido uma biblioteca com todos os livros, próprios e impróprios para a minha idade, ah...lá isso gostaria, sim!
    O meu primeiro livro, mesmo meu, tinha por título "Maria Tonta".

    Ainda não tinha aprendido a ler e já ansiava pelo dia em que pudesse descodificar aqueles caracteres que via impressos nos livros da minha irmã. A minha vontade era tanta que a aprendizagem foi fácil. E que belo foi viajar pela poesia dos meus livros escolares!
    Hoje, que poderia comprar os livros que bem entendesse, tenho dias em que o poder de concentração me foge para longe, e já compro livros só pelo vício de os comprar...Que mais me irá acontecer de mal, que mais?

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    1. era para ter colocado essa questão, quais os primeiros livros, obrigado por leres pensamentos :D
      compro muita coisa, mas também leio muito, finalmente :D mas mesmo assim, para ler tudo o que tenho, 40 anos nã me chegam... tenho de acelerar o passo

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  2. Eu tive vários da Majora da colecção Formiguinha...desapareceram todos.

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    1. engraçado, lembro da formiga de meias calças vermelhas, mas nã dos livros :D

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    2. Eu também me lembro de uma mas as meias não eram vermelhas
      https://youtu.be/tjvg5JRdQoE

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    3. a formiga que tinha uma carraça amiga :D lembro muito bem
      e um gafanhoto como cavalo... e aquele lencinho com bolas?
      (vi o Sharp Objects, gostei)

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