infatigável

 

O transporte partiu a horas. Estava menos gente do que é costume. Não sei se o frio faz com que regressem mais cedo, ou se algumas já abandonaram de vez a estação. O dia de hoje foi pior do que ontem, mas não me ouvem queixar. Procuro um lugar em que possa esticar um pouco o joelho esquerdo. Manquejo e as mãos estão gastas e doloridas. Pondero se abro ou não o livro de quatrocentas páginas, mas esta parte até que é interessante. Ler sobre o homem que tem frio e se deita na cama de robe vestido, dá-me sono. Mudou-se para esta casa com vista sobre o Tejo e desde que chegou, a chuva não lhe dá tréguas. Gostava que aqui também a chuva batesse infatigável nas vigias. Enquanto escrevo, os olhos fecham. As mãos descansam sobre as letras à espera. As mesmas mãos que passaram o dia a construir e destruir e que mal conseguem segurar um livro de quatrocentas páginas.