bigorna

e o homem que gritava pelo anjo

Acordei antes das quatro com a bigorna e o grito que mais parecia uma serra de cortar metal. Mas é curioso que não acordei assim que o homem começou a martelar energeticamente e a gritar pelo maldito do anjo. Estava a sonhar e o barulho implantou-se no sonho, fazendo parte dele como se assim tivesse de ser. Nem me lembro bem do enredo, mas havia alguém que lá do alto do minarete, martelava a bigorna ritmadamente quatro vezes e ao fim dessas quatro batidas, gritava uma espécie de chamamento metálico, como se viesse de um amplificador. Quando acordei levei ainda algum tempo para entender o que se passava. Alguém algures no prédio batia realmente compassado quatro vezes numa porta, e depois parava e gritava “Gabriel”. Era no mínimo curioso que o homem nunca batesse e gritasse em simultâneo e seguramente repetiu o procedimento na perfeição durante uns vinte minutos. 

Fiquei então a imaginar o anjo adormecido do outro lado daquela porta, num daqueles apartamentos renovados de duas assoalhadas virados para leste. Talvez tivesse bebido demais nos festejos e jazia comatoso, as asas desaprumadas, caídas uma para cada lado, de barriga para baixo para evitar a asfixia do vómito. Completamente apagado, o “anunciador da palavra”. Aquele que supostamente traria a justiça e a verdade, o amor e a fraternidade, era agora um caído pela tentação do álcool e indiretamente, o causador de uma noite mal dormida. E do meu mau humor no dia seguinte. 


A torre da cidade de Ferrix, da série que entra nos meus sonhos - "Andor". 


Comentários


  1. Malha, malha, ó malhador
    Malha o ferro quente em brasa
    De tanto malhares o ferro
    Para moldares o teu amor
    Ficaste com um grão-na-asa.

    Boa semana, Manel, dos sonhos loucos!

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  2. Há muito não passava por aqui!
    Bom ler-te!

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