liberdade
Não sei como era em vossas casas, mas na minha havia sempre
música a tocar no gira-discos. Eram tempos formidáveis. As pessoas reuniam-se
para conversar, fazia-se uns petiscos, depois cantavam, dançavam e brindavam ao
Trotsky, ao Che, ao Zeca. Havia um lado A e um lado B. Nas paredes lá de casa tínhamos uma gravura do Sakharov triste, frases
do Brecht e do Gandhi, e crianças no Vietname. As divisões e os carros eram
pequenos, vivíamos muito juntos, mas nunca apertados e as férias duravam três meses. Tempos formidáveis em que havia dois canais, mira televisiva e os ditadores iam caindo que nem tordos: o Marcus, o Pinochet, o Ceausescu... Também caiu um muro que já não se aguentava e o apartheid terminava quarenta e seis anos depois com a eleição de Mandela. Foram os anos de aprender a liberdade. Os últimos, eu lembro-me, plenos de felicidade.
Tudo tem dois lados, tudo esconde interesses de alguém/alguns. Prefiro ficar-me por aqui, porque até as opiniões para o serem, têm que ser pelo menos duas.
ResponderEliminarBoa noite afilhado mailindo
Bom domingo madrinha, beijos
EliminarGostei de ler.
ResponderEliminarNa minha, em Luanda onde me encontrava na altura, ( o marido era militar e estava em comissão no Comando Naval, não havia TV, que ainda não tinha chegado lá; apenas um pequeno transístor que ligava todas as manhãs antes de ir para o trabalho , mas que não me deu a notícia da revolução antes me inundou de marchas militares. O 25 de Abril para a gente só chegou a 26. E depois veio a guerra, os ataques surpresa à cidade, os incêndios nos musseques, milhares de desalojados na ilha, nos campos do colégio, pela cidade toda à espera de um barco ou avião que os trouxesse para cá. O
recolher obrigatório, o medo de sair à varanda e levar com alguma bala perdida. Enquanto por cá se festejava com alegria a liberdade, lá morria-se de medo. Quando o marido acabou a comissão em Junho de 1975, e regressamos sãos e salvos, aí sim começou para nós o 25 de Abril.
o meu 25 de Abril ainda é mais tardio, que eu só nasci quatro anos depois :)
Eliminarobrigado pela visita Elvira e pelo belo testemunho
Já a minha vivência tão diferente da tua.... já houve tempo em que ouvia com inveja relatos como o teu. Retratos de uma infância pintados com as cores bonitas dos afectos e da ligação ao mundo que os rodeia. Depois aprendi... que cada um pinta a vida com as cores que tem na paleta. E que não são só as cores que emprestam felicidade, ou vida, ou boas memórias. A minha infÊncia foi de uma liberdae imensa E por isso estou grata. Mesmo sem Trotsky, ao Che, ao Zeca....
ResponderEliminarGostei muito (mesmo) de te ler!
eu lembro-me de invejar os que tinham vivido a revolução, mas agora entendo que vivi num planalto revolucionário que me preparou para algo que desperdicei...
Eliminarobrigado
Que bonito, ainda vivi uns ecos desses tempos felizes.
ResponderEliminarE a queda das ditaduras e das barreiras, algo inesquecível mesmo. Ainda hoje acordava a pensar na minha filha de 23 anos, prestes a acabar o curso, comparativamente os meus 23 eram tão mais auspiciosos....
~CC~
tive uma infância muito feliz, num tempo que prometia ser de mudança... espero que nã tenham sido os últimos dias
Eliminarbom domingo CC
Antes do 25 de Abril de 1974, quem tinha gira-discos?
ResponderEliminar... Quem tinha tv ?
--- Quem tinha carro?
--- Quem tinha.......
Tantas perguntas que se calhar muito poucas terão resposta
.
Um domingo de paz e amor
se calhar só alguns, os mais ricos. os meus avós nem tinham carta de condução. mas eu já nasci no tempo da abundância, um felizardo!
Eliminarbom domingo
Gostei muito de saber como foram os tempos pós-revolução de Abril, na tua casa, Manel.
ResponderEliminarSendo eu, - supondo ser - da geração anterior à tua, as minhas vivências desse tempo são diferentes. Não tinha tempo, nem alegria, para viver a euforia da mudança, com danças e petiscos.
Isso do som da música, no tempo da minha infância, não saía do gira-discos e sim, da telefonia... Apesar dos pesares, foi esse o melhor tempo da minha vida.
Simplesmente por ser criança, e ainda ter capacidade para acreditar no futuro.
Beijos, Cigano! :)
um pós-revolução muito pós... estava a falar do tempo no fim dos anos 80! Talvez nã estivéssemos sempre a dançar e a comer, mas é o que me lembro com nove, dez anos.
EliminarBeijos, Janita
Claro Manel, eu entendi... :)
EliminarPois se fazes referência à queda do muro de Berlim... :)
Ando mal com a internet, vira não vira, vai-se... :(
Não sei como era o Antes do 25 de Abril, depois tentei saber mais além do que é dito na Escola e passa na televisão, o antes, durante e depois poderia não ser muito diferente para uma criança, mas seria muito diferente quando começasse a pensar, a trabalhar, etc. e acho que não gostaria nada de ter vivido então nesse antes
ResponderEliminaracho que mesmo para uma criança nã era nada bom. os meus pais dizem que eram segregados e tinham de ir trabalhar muito novos. nã havia os mesmos direitos para todos... tive sorte de nascer num tempo muito diferente...
EliminarSempre fui mais fã do Lado B.
ResponderEliminaré bom escolher um lado... mas como em quase tudo, nã saberia dizer qual o meu preferido
EliminarForam tempos de euforia e de aprender a liberdade um pouco a medo e enquanto não se sabia muito bem o que aquilo dava, os homem continuavam a jogar às cartas na coletividade e as mulheres a ver quem passa à janela. Já nós, os miúdos brincávamos na rua até à noite. Tenho boas recordações dessa altura apesar de ser bem novita :)
ResponderEliminaro que me lembro é de um tempo sem tempo, sem a correria, sem obrigações desmesuradas :) por isso para mim, era feliz
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