epiglote
Esta é a história do homem que acordou certa manhã com uma
nuvem negra a sobrevoar a sua cabeça. Era uma nuvem invisível, embora carregada
de negro, sem forma definida ou profundidade. E nada mais podemos acrescentar
sobre isso. Naquele dia em que acordou com a tal nuvem, que na verdade não seria um dia muito diferente de todos os dias com a excepção de uma nuvem, sentiu que a sua vida não fazia qualquer sentido
e que por mais que se esforçasse, nunca seria bem sucedido. Não posso afirmar se
este facto estaria ou não relacionado com a tal nuvem que pairava a alguns centímetros
acima da sua cabeça, mas era no mínimo estranha a coincidência. Acho que já disse que a nuvem era negra. E com isso não pretendo dizer que era escura, ou de outra raça. Era negra porque a energia que a constituía era negativa, e o negativo toda a gente sabe que é negro. E invisível.
Passou então ligeira a manhã até à pausa para o almoço na companhia da nuvem que não tinha apetite. O
homem meteu na boca uma mão de frutos secos e caminhou vencido até ao relógio
de ponto, seguindo sem atenção as pontas gastas das botas. Desisto, disse o homem em pensamento,
esta vida vazia não serve. Sou um fardo que aqui ando. Mas assim que o pensou, uma
pele da amêndoa deslizou pelo canal errado e sozinho, num corredor onde não
passava ninguém, sentiu o ar faltar-lhe. Vou morrer, pensou o homem, com os olhos afogados em lágrimas. Uma tosse
violenta quase o lançou ao chão. Vou morrer engasgado e sozinho, pensou o homem que já nem queria saber da nuvem e nem das botas gastas, ou das meias rotas. O ar mal chegava aos
pulmões, era lenta e dolorosa. Vão abrir-me numa mesa de autópsia, pensou o homem. Forçou a respiração, tossiu com força uma e outra vez, até sentir a
obstrução desaparecer. Limpou as lágrimas. Marcou o ponto. E a nuvem lá acabou
por se desfazer.
Odeio amêndoas, não lhes conhecia tamanhas qualidades curaticas.
ResponderEliminarOlá.
serias perfeita para partilhar embalagens de frutos secos... as amêndoas são de longe as minhas preferidas :)
Eliminarolá, tudo bem?
Sabes Manel? O homem que quase morria engasgado com uma minúscula, porém carracenta, pele de amêndoa, não sabia, mas eu sei, que a nuvem negra que lhe pairava sobre a cabeça, era a saudade de escrever. Nada como um bom ataque de tosse para afugentar para longe o desânimo e o negrume de uma alma saudosa. Quase me sinto tentada a abençoar essa pele grudenta...
ResponderEliminarVem a meus braços, meu cigano preferido. :)
Beijos.
abençoas a pele que quase me matou? que rica amiga :D
Eliminartens mais ciganos na tua vida além de mim? tou a ficar ciumento... beijos, mil e um
É mesmo assim. Nada como a sombra da morte para desfazer a nuvem e nos agarrar à vida.
ResponderEliminar~CC~
se fosse só a sombra :) ela veio com todas as forças apertar-me o gasganete... mas eu disse-lhe que afinal podia ir dar uma curva, ainda nã tinha chegado a minha hora
EliminarConheci alguém que não queria viver mas que não comia laranjas à noite porque o povo diz que a laranja à noite mata
ResponderEliminardeus me livre de comer laranjas à noite... morria logo ali :)
Eliminarse comesse antes nozes, pinhões, sultanas, avelãs, caju, o homem da nuvem negra jamais teria passado por isto :)
ResponderEliminar___________
p.s. - uma alexandra dixit, uma não comedora de amêndoas desde a infância :D
felizmente, ou nã, como tudo... com a mesma vontade de sempre :) mas tenho a certeza que foi a sacana da amêndoa, e tão cedo nã como uma sem primeiro a olhar bem nos olhos... a sacana :)
Eliminarduas sugestões, Stormy:
ResponderEliminar- tritura-as, prmeiro
- escolhe a História da Arte, delicia-te com a mandorla :)
Nem uma alminha para te dar um murro no costado? Pobre afilhado que ia fenecendo com uma amêndoa. Não deixa de ser estranho, quando na garganta, os homens têm a maça de Adão. Se calhar é uma maça descascada eheheheh
ResponderEliminarBrijinho afilhado mailindo quinté. Tinha saudades tuas.
é uma maçã descascada madrinha, só assim é que a Eva convenceu o Adão :D
Eliminarbeijos, também tenho saudades tuas, carago
A vida, afinal, pode resumir-se a uma prosaica viagem da pele de uma amêndoa...
ResponderEliminarBeijocas repenicadas, Manel das Tempestades :)