Érato

... ou a Amável

A musa de lábios inconsequentes abriu a agenda sem pressa em cima da mesa ignorando a minha ansiedade. Desfolhou para a frente e para trás a última semana de abril, molhando o indicador com a língua à passagem de cada dia. E cada vez que o fazia, mortificava-me no jugo daquele gesto, desejando afogar-me na sua saliva, morrer agarrado ao rebordo do seu beiço.
Lamento Sr. Maltes, mas esta semana é impossível… Disse secamente, sem afastar os olhos das páginas pautadas em branco. Se me tivesse falado a semana passada tinha conseguido, mas assim, tão em cima da hora… Terminou, fechando o pequeno caderno negro com um leve sorriso a provocar no canto, enfrentando-me sem sinais de comiseração.
Mas eu contentava-me apenas com umas horas. Quase implorei, eu que até então dominara a negociação, exigindo a sua presença a tempo inteiro, minha possessão, sem antever o efeito que aquela boca exercia sobre mim, agora declinava aflito. Veja lá ai na sua agenda menina Clara, é muito rápido, nã lhe ocupo um dia, só preciso de uma leve inspiração e depois a coisa há-de ir… ou vir


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